domingo, 30 de setembro de 2007

05 – Traumatismo ucraniano



Depois de correr de forma desengonçada (os russos não têm a nossa ginga latina) pelo acostamento da estrada por uns bons cinco minutos, Vladmir sentou-se sob uma mangabeira com o nobre intuito de tomar um ar. Não demoraria para que o encontrassem ali, mas ele sentia-se seguro: o Druida tinha hérnia e não se sujeitaria a perseguir pessoalmente um ladrãozinho de papéis, e os siameses da cantina sinceramente tinham mais o que fazer. Mas o sumiço de Natasha Maria o transformava num provável próximo alvo e ele precisava decidir o que fazer.
Começou a folhear a papelada. A primeira folha trazia o título de “Lista de Compras” e indicava o equipamento necessário a Vladmir para o resgate de Natasha: uma caixa de fósforos, uma cama elástica portátil, canetas hidrocor variadas, uma pistola de Master System e o disco novo do Bon Jovi pra animar a viagem.
As folhas seguintes traziam mapas detalhados que mostravam todo o caminho para se chegar ao Ninho de Mafagafos, partindo de Pripyat, passando pelos Lagos Longínquos da Pantúzzia, cruzando as Fronteiras Infernais do Veberquistão e terminando na simpática e provinciana capital do estado de Minas Gerais, nas Alterosas Brasileiras.
Vladmir embarcou naquela aventura de corpo, alma, joelho e pé. Passou no Wal-Mart mais próximo e fez as compras, depois trocou alguns dólares ucranianos por cruzados novos (a taxa de câmbio na época era um pra um) e iniciou a jornada. Os primeiros dias foram estafantes. Anos depois, concedendo uma série de entrevistas que culminariam na sua autobiografia não-autorizada, “Vladmir – Uma Vida Burlesca”, ele comentaria:
- Foram tempos difíceis, aqueles. Sobreviver era complicado e fiz coisas que ninguém acreditaria. Dormi de conchinha com uma bibliotecária aposentada em troca de dinheiro. Comi pão com papinha de nenê fermentada, que dava mais onda. Bebi guaraná na xícara de porcelana pra economizar copo de plástico. Não era fácil não.
A primeira dificuldade de verdade, contudo, apareceu só depois de uma semana. Era um domingo ensolarado com nuvens esparsas que prometia bastante, mas foi só Vladmir acordar e olhar para sua mão esquerda que o ânimo sumiu completamente. Ele sabia: eram os primeiros efeitos da radiação derivada da explosão da usina.

Frase do próximo capítulo: “Melhor seria se o furúnculo fosse na outra perna.”

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